Os Imbróglios da notícia e a agonia por perplexidade.
Não se pode dar uma prova de existência do que é mais verdadeiro, o jeito é acreditar. Acreditar chorando." Clarice Lispector - A Hora da Estrela
Hoje, dia 18, os meios de comunicação informam sobre seu provável indiciamento por ter inventado a história. Não me interessa aqui discutir se a brasileira é ou não culpada, mas esse evento me chamou atenção para outra questão: a forma como as notícias são, atualmente, despejadas de forma irrefletida em nosso cotidiano.
A pressa em comunicar, antes de todos, o fato novo, extraordinário, chocante ou jocoso, transformou parte dos meios de comunicação em verdadeiras fábricas de acontecimentos, elaborados quase em cadeia de produção tentando alimentar uma sede predatória por audiência.
Vou lembrar aqui somente dois exemplos, que por sorte não tiveram grande repercussão ou efeitos, o que no caso de uma informação, seja ela verdadeira ou não, pode ter a força devastadora.
No dia 20 de maio de
O outro exemplo, cômico se não se desse em uma situação trágica, ocorreu na época do acidente nas obras do metrô de São Paulo, quando várias emissoras de Tv, consultaram um importante engenheiro do exército sobre as causas que levaram à abertura da imensa cratera no centro da cidade. Rede Globo, Bandeirante e Record, foram algumas que deram espaço ao profissional. O exército, desconhecendo tão “renomado” engenheiro em seus quadros, reclamou sua identificação às emissoras, o que levou a descoberta que o engenheiro, nada mais era do que um rapaz com problemas mentais, que se fazia passar comumente por vários profissionais: cabeleireiro, médico... engenheiro. Constatação constrangedora que na época somente a Tv Bandeirantes teve coragem de admitir.
Na ultima quarta feira, dia 11 quando eu liguei a Tv, para assistir ao do Jornal Nacional, a apresentadora Fátima Bernardes, fazia as chamadas das manchetes daquela noite tendo como abertura justamente aquela que se referia ao caso da brasileira.
“Barbárie! Jovem brasileira grávida de gêmeos é atacada por skinheads na Suíça e perde os bebês”, uma semana depois, ao assistir ao mesmo jornal, a manchete já não abria o jornal e era bem mais contida: “Brasileira é indiciada na Suíça por suspeitas de inventar gravidez e agressões”
Agora, “supostamente” ela “teria” sido ataca por skinheads e provavelmente não "estaria" grávida no momento da "hipotética" agressão. A imprensa suíça informa que ela “teria” dado um depoimento no qual “assumiria” ter mentindo em sua primeira versão.
No caso, o que menos importa aqui para nossa análise é saber se o evento ocorreu ou não, tal como narrado pela brasileira, afinal, qualquer pessoa pode contar uma história surpreendente, constrangedora, que pode ou não, se considerada verdadeira, qualquer um pode relatar algo que ocorreu a si ou a outrem. O que poderia se esperar, no entanto, é que a os meios de comunicação estivessem, como estão, preparados para essas possibilidades.
Entretanto, o canto da sereia do furo jornalístico que irá alimentar durante longos e lucrativos dias a audiência e a venda de jornais, muitas vezes acaba por deixar em segundo plano a prudência e a reflexão sobre o que se informa. A ânsia por apresentar a “miséria” a “barbárie” o “inacreditável” parece comandar o agenciamento das notícias na contemporaneidade. Dessa maneira, não posso de deixar de citar José Ribeiro[2]:
“Ontem era Binladen e o Afeganistão, a Bósnia e o Kosovo. Os massacres em Ruanda e no Burundi. O processo de paz de Angola. A subida eleitora de extrema-direita européia (...) da catástrofe aérea ao ciclone, do atentado ao acidente rodoviário, do fait-divers ao crime de guerra, nos êcrãs televisivos uma desgraça segue-se a outra. E a explicação do mundo reduz-se cada vez mais a uma volta ao mundo do sofrimento”
Pulamos de notícia em notícia sem sabermos nunca o desenlace do último grande e extraordinário escândalo. Calheiros, Valérios, Nardones, Vasconcelos, Obamas e Osamas, saltam aos nossos olhos sem que nunca saibamos para onde vão, verdade que foi-se o tempo em que o receptor era visto como mero receptáculo da massa informativa, todavia, não se pode deixar de considerar que sofremos cada vez mais de uma doença: agonizamos por perplexidade.
Niterói, 18-02-2009. Sônia Meneses
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1 http: //www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u403859.shtml
2Ribeiro, José. Os acontecimentos como actos de palavras. Sevilha. Revista científica de Información y Comunicación. Número 3, (2006).
Comentários
No entanto, a superficialidade e a má qualidade de seu jornalismo são marcas visíveis.
Outra questão que se coloca é que seus editores-chefes pautam ou tentam pautar a nossa vida. Se decidem em um determinado mês falar das estradas, "coincidentemente" todos os jornais e sites dessa mídia corporativa tratam do mesmo tema, numa "impressionante" similaridade.
Fora a partidarização explícita. é só olhar as manchetes da época do "burcao do metrô", nenhuma referência ao partido do governador (PSDB) ou agora, na cassação do governador da Paraíba (também do PSDB), nenhuma referência. Se fossem do PT, aí sim estaria lá que o buraco do metrô ocorreu no governo do PT etc etc.
Lembra do acidente da TAM em São PAulo? Federalizaram a questão..
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Passei uns meses lendo a Piauí depois que vi uma entrevista do João Moreira Salles falando exatamente sobre este diferencial da revista: uma certa falta de pressa. As informações, segundo ele, não seriam jogadas ao léu em prol da rapidez, seriam avaliadas e publicadas com muito cuidado, mesmo depois de meses. O conteúdo também é mais longo e a revista não tem tantas imagens quanto uma Veja da vida. Embora seja mais literária que política, achei bem interessante, gostei e li por um bom tempo. Embora não me iluda com a inocência de meio de comunicação nenhum. rs