Cartas para o Futuro
Escrevo cartas para o futuro, não sei ao certo quem as lerá ou se alguém as lerá, mas ocorre comigo uma estranha ansiedade por me comunicar com desconhecidos. Não somente pessoas, mas mundos que certamente nunca verei. Ocorre-me também a franca sensação de que dessa forma estarei em um outro tempo, como se as palavras e os rastros que deixo impressos ao vento, em meu presente, falarão suave ou enfurecidamente a alguém que não conheço. Minhas cartas para o futuro são propositadamente sofismáveis, tentam convencer a quem tomá-las nas mãos, retrospectivamente, de que eu queria dizer exatamente o que eles tentarão ler em suas entrelinhas. Mas advirto: não haverá nenhum entre linhas nelas. Certamente, aqueles que os encontrarem se enganarão porque não pretendo mandar-lhes nenhuma mensagem secreta, nenhum significado original. Nelas, falarei pretensiosamente para mim, dessa forma poderei tranqüilizar a alma e exorcizar os antigos demônios em mãos estranhas. Mas, é possível também, que estas cartas levem tênues perfumes do meu tempo, do meu corpo, das minhas mãos passeando sobre elas. Odores imaginários, silêncios buliçosos que incomodarão quem as ousar ler. Minhas cartas falarão de nós, de mim e de você, palavras fluídas de um tempo estranho. Um tempo que muito mudou, em as pessoas mudavam todos os dias numa corrida ensandecida em busca de... De que? Isso também não irei revelar-lhes. Algumas serão nostálgicas, outras melancólicas, há ainda aquelas amorosas, as revolucionárias, as carinhosas, ou simplesmente, cartas que falam de reencontros, amizades e despedidas. Mas, é provável que elas não tragam muita novidade, afinal, todo tempo carregar seus redemoinhos, apesar disso, talvez minhas cartas possam deixar a impressão de que eu, você e eles não sentíamos nosso tempo da mesma forma. Elas falarão de meu espanto, e talvez do seu, sobre um tempo que mesmo sendo o nosso, nos é também estranho. Minhas cartas para o futuro, são na verdade, a ansiedade de um mundo que não se quer fazer esquecido, mas que ao mesmo tempo, escolhe o que deverá ser lembrado, nesse sentido, elas são ingênuas também, porque lá, no outro mundo no qual chegarão, também irão escolher-lhes os esquecimentos e as lembranças, lá, minhas cartas para o futuro, não serão mais minhas, serão as cartas do passado, falarão muito mais sobre aqueles que as lerão, do que de nós. Sônia Meneses, Niterói 11 fev 2008.
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