O mundo selvagem da república das cuecas

Com quantas cuecas se faz uma fortuna?

Essa é uma pergunta que tenho me feito esses últimos dias nos quais fomos brindados pelas obscenas imagens de cuecas cheias no horário nobre.

Em outros tempos, haveria ao menos um aviso para que tirássemos as crianças da sala, ou um alerta para que pessoas idosas ou de coração fraco pudessem se preparar para as cenas chocantes que iriam assistir. 

A voracidade com a qual alguns dos espécimes de políticos se atiravam sobre os maços de dinheiros me fez lembrar aqueles documentários do National Geographic sobre predadores. Aquele brilho no olhar, a euforia, ao vislumbrar o objeto do desejo, denunciava um misto de selvageria e excitação. Em sua ferocidade e urgência, vimos os políticos predadores atacarem os pacotes valiosos, que aos nossos olhos foram devorados, extirpados, dilacerados em vários pedaços dispostos em bolsos, meias, sacolas e claro, cuecas.

As cenas nos deixaram ver ainda, a face franca de alguns dos representantes do povo. Para aquele que reclamavam que nunca haviam visto sinceridade nos olhos de um político, saibam que ali foi um momento singular de entrega, melhor dizendo, da entrega dos pacotes.

Devo admitir que tive asco em boa parte dessas cenas. Embrulha-me o estômago ver a patifaria configurada como cultura política.

Se para eles, excita-lhes a corrupção, o enriquecimento ilícito à custa de verbas públicas, as manobras políticas para salvar a pele de corruptos contumazes, a nós, cidadãos, suas condutas causam-nos repugnância e indignação. Vivemos dias nauseantes! Sobretudo, quando assistimos a tramas urdidas para safar corruptos, que ao serem acuados, revidam: eu também sei radicalizar! Como que, anunciando-nos, que muitos outros devoradores de pacotes estão por ai, soltos e bem nutridos.

Quantos séculos ainda serão necessários para que nossa mentalidade política se modifique de forma a não elegermos nem produzirmos mais políticos predadores do bem público?

Esse ano o Brasil fez 120 de república. Se o prazo é relativamente curto para a história, é longo para os danos sociais causados por gerações de parasitas. Uma república que desde o começo teve o arrivismo como prática. Lição exemplarmente aprendida e nunca esquecida em nossos gabinetes e assembléias. Uma cultura política cujos pilares mais duradouros têm sido a corrupção, o peculato e o nepotismo. Atitudes que orientaram máximas lastimáveis como o “rouba, mas faz”, ou o “país do jeitinho”, e “todo político é ladrão”, preceitos que somente corroboram com a passividade diante do que é considerado como inevitável, como se fosse da ordem da natureza, ou uma equivalência matemática, equiparar vida política e desonestidade.

Cada maço de dinheiro metido na meia ou na cueca, tem como resultado as dificuldades estruturais de nossas escolas, as fragilidades de uma saúde pública deficitária e a injusta distribuição de renda em nosso país.

A conduta de nossos políticos, e a nossa própria postura política, não podem ser avaliada somente em termos de preceitos de uma moralidade duvidosa que naturaliza o que é roubo; o que é crime!

É preciso que derrubemos a república subterrânea de roubalheira que se instalou sob nossas instituições públicas e governamentais, é preciso, principalmente, dizermos não à república das cuecas em nosso país.

Chage retirda do blog O Anacoluto, no endereço:http://escritor.blog.uol.com.br/arch2005-07-01_2005-07-31.html

Comentários

Rosilene Melo disse…
O que faltou somente foi aquela ávida deputada colocar o dinheiro na calcinha. Depois fazer propaganda de uma marca de langerie e, depois, capa da Playboy.

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